Dificilmente, com tanta coisa acontecendo no mundo, você já deve ter parado para pensar nos dentes de Adolph Hitler. O líder alemão na Segunda Guerra Mundial certamente tinha características que chamam bem mais a atenção – do seu bigode aos seus planos genocidas.
Mas os dentes de Hitler se tornaram protagonistas da história da ciência. Primeiro, porque eles eram especiais – e não de um jeito positivo. Seja por predisposição genética ou por maus hábitos de higiene, ele teve seus dentes originais trocados por uma série de coroas (próteses fixas coladas em cima de um pedaço de dente existente) e pontes (a mesma coisa que a coroa, mas feita para substituir e cobrir o espaço de vários dentes). Também corre o boato que, por consequência desse histórico todo, Hitler tinha mau hálito constante.
A qualidade duvidosa da dentadura de Hitler acabou se tornando uma vantagem – ao menos para as múltiplas pessoas que tentaram identificar seus restos mortais ao longo da história.
Essa foi a primeira vez, porém, que um grupo independente de cientistas teve acesso ao pouco que restou do corpo do ditador alemão.
Desde então, o acesso aos tais restos mortais – que incluem um fragmento de crânio e pedaços dos dentes e do maxilar de Hitler – jamais tinha sido liberado a qualquer grupo sério de pesquisadores. Com essa falta total de verificação, um zilhão de teorias conspiratórias que dão “versões alternativas” à morte do ditador começaram a surgir (algumas diziam até que Hitler teria escapado para o Brasil, imitando o médico nazista Josef Mengele, que viveu um exílio caipira em terras canarinhas por 20 anos).
Esse cenário mudou em março de 2017, quando a FSB (o serviço secreto russo que substituiu a KGB) autorizou um time de patologistas franceses a dar uma olhada nas sobras.
A primeira conclusão a que eles chegaram, no artigo publicado no periódico European Journal of Internal Medicine, é que os restos são definitivamente de Hitler. Não foi feita nenhuma análise de DNA. Entra aí a esquisitice da dentadura: os dentes de Hitler eram tão notoriamente ferrados que os cientistas consideram impossível que eles pertençam a outra pessoa.
Essa conclusão é baseada em uma radiografia tirada um ano antes da morte do líder nazista, e em anotações da equipe de dentistas que tratou dele – tiradas à força.
Os responsáveis por criar as próteses de Hitler foram “gentilmente” convidados pelos soviéticos a dar todos os detalhes que sabiam sobre os dentes do Führer. O desenho resultante (com as anotações originais em russo, caso interesse) você confere abaixo, num tweet do historiador Roger Moorhouse.
The sketch of #Hitler's teeth, drawn from memory by dental assistant Käthe Heusermann, which matched exactly the teeth retrieved from the Reich Chancellery garden. Image from Yelena Rzhevskaya's book. #HuntingHitler pic.twitter.com/zZorI7SDoq
— Roger Moorhouse (@Roger_Moorhouse) May 5, 2018
Primeiro, eles afirmam que dos 32 dentes do Führer, apenas 4 eram originais e intocados. Eram todos incisivos mandibulares.
Em alguns dos seus dentes falsos, foram encontradas manchas azuladas – provável sinal de que ele tomou cianureto para garantir que morreria envenenado, caso o tiro não desse certo.
Falando em tiro, os fragmentos cranianos dão indícios de um tiro na cabeça, conforme a versão oficial da morte. Mas os dentes garantem que nenhuma arma foi colocada na boca: Hitler precisa ter dado um tiro na testa ou no pescoço.
Por fim, a descoberta confirma o respeito que Hitler supostamente tinha pela vida animal: ele, de fato, era vegetariano. Os cientistas confirmaram isso observando, com microscópio eletrônico de varredura, a placa bacteriana do Führer. Isso mesmo: a cultura de bactérias da boca que se alimenta de microrrestos de comida. Os restos dentais de Hitler não continham nenhum resquício de origem animal, apenas vegetal. E um tanto de tártaro. Eca – ou melhor, ekelig.