O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte suspendeu a cobrança da taxa de bombeiros, inserida no Imposto Sobre Propriedade de Veículos Automotivos (IPVA) 2019. Por oito votos as seis, o Pleno do TJRN optou pela suspensão imediata da cobrança da taxa até o julgamento do mérito da ação, que ainda não tem data marcada para acontecer.
Adiado duas vezes, o julgamento havia sido suspenso no dia 27 de fevereiro com o placar parcial de 7 votos a 6 pela suspensão. Como os desembargadores Cornélio Alves e Zeneide Bezerra estavam ausentes, a questão foi adiada até que eles voltassem, para garantir maioria absoluta na votação. Nessa quarta-feira (13), a desembargadora Zeneide Bezerra proferiu seu voto, favorável ao pedido do Ministério Público, formando a maioria absoluta pela suspensão. O desembargador Cornélio Alves esteve no pleno, mas não computou o voto na questão.
Desde janeiro deste ano, os potiguares se depararam com uma duas novas taxas inseridas no IPVA: a primeira, taxa dos Correios, tinha o valor de R$ 7,00, destinado ao envio dos documentos. A segunda, a “taxa dos bombeiros”, custava R$ 15 para motocicletas e R$ 25 para carros – o valor aumentava proporcionalmente ao porte do veículo, podendo chegar a R$ 80 para veículos de transportes de cargas perigosas.
A “taxa dos bombeiros” foi criada para “proteção contra incêndio, salvamento e resgate em via pública para veículos automotores, aplicada anualmente a cada veículo licenciado no Estado do Rio Grande do Norte”. Foi aprovada pela Assembleia Legislativa e sancionada em dezembro de 2017, pelo então governador Robinson Faria (PSD). Na prática, a Lei garantiria uma arrecadação anual superior aos R$ 20,5 milhões para o Corpo de Bombeiros Militar do Rio Grande do Norte.
O dinheiro seria destinado para o Fundo de Reaparelhamento do Corpo de Bombeiros Militar do Rio Grande do Norte (FUNREBOM), e não poderia ser utilizado para pagar despesas diárias ou salários, apenas para investimentos e reaparelhamento.
Apesar de ser nova para o RN, a “taxa de bombeiros” já havia sido instituída em outros Estados, e gerado divergências judiciais que chegaram até o Supremo Tribunal de Federal (STF), que definiu que a cobrança seria inconstitucional para municípios.
No dia 9 de janeiro, o Ministério Público do Rio Grande do Norte (MPRN) entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade contra a nova cobrança.
Na ação, a a Procuradoria-Geral de Justiça do Estado afirmava ter instaurado o ofício “em razão de vislumbrar a presença de vícios de inconstitucionalidade no texto da Lei Complementar Estadual nº 247/2002, alterada pela LC nº 612/2017”, lei que dispõe sobre a criação do FUNREBOM, e institui as taxas de exercício de poder de polícia e pelos serviços prestados pela corporação – dentre elas, a cobrada no IPVA.
Além da suspensão cautelar da taxa de bombeiros, o MP pediu também a suspensão de dois outros itens da Lei Estadual que cria o FUNREBOM: o item 1, que trata das taxas de “prevenção e combate a incêndios busca e salvamento (resgate de pessoas não envolvidas em acidentes automobilísticos) em edificações e outros ambientes” para imóveis localizados na região Metropolitana de Natal e o item 2, que estabelece uma taxa similar para o interior do Estado.
Devolução
Na etapa atual da ação, o que foi deferido pelo Pleno do TJRN está relacionado apenas ao pedido cautelar do MPRN, que suspende os efeitos da Lei que determinam a nova cobrança. Como o mérito da questão relativa à ação de inconstitucionalidade em si ainda não foi apreciado, o TJRN afirma que “o contribuinte que já pagou a taxa ainda não pode requerer a devolução do valor pago até que a questão seja resolvida definitivamente”.
Caso, após o julgamento do mérito a cobrança da taxa seja declarada inconstitucional, aqueles que já efetuaram o pagamento poderão entrar com uma ação de repetição de indébito, solicitando o reembolso do valor pago.
Até o dia 20 de fevereiro, mais de R$ 300 mil já haviam sido arrecadados através do Tributo.
STF
A questão do Supremo Tribunal Federal levantada pelo Procurador do Estado Renan Maia é um dos pontos de divergência entre o Estado e o Ministério Público. Em maio de 2017, o Supremo Tribunal Federal julgou, por 6 votos a 4, a inconstitucionalidade da cobrança das taxas de combate a incêndio por municípios.
Na decisão, o Ministro Marco Aurélio cita o artigo 145 da Constituição, que afirma não ser possível instituir taxas que tenham como base de cálculo o mesmo elemento que se dá a um imposto, uma vez que eles incidem diretamente sobre serviços usufruídos por todos os cidadãos, o que os torna indivisíveis.
O procurador Renan Maia, no entanto, ressalta que a decisão do STF diz respeito apenas a aplicação de taxas por municípios, “Ali se aferiu a inconstitucionalidade de uma taxa municipal, e a razão disso era muito mais uma incompetência dos municípios para remunerar por taxa um serviço que é atribuição constitucional do Estado”, afirma.
No entendimento da Procuradoria Geral de Justiça, os serviços que estavam sendo cobrados através da taxa extra estabelecida pela Lei Complementar nº 612/2017, que alterou a Lei Complementar Estadual nº 247/2017, “são inerentes à segurança pública estadual, compreendida em seu significado técnico-jurídico”. Em outras palavras, o MP sustenta que a taxa cobrada pelo Estado diz respeito a serviços que já são obrigações previstas para o Corpo de Bombeiros Militar por lei, não sendo possível fazer uma cobrança extra por isso a uma categoria específica da população em forma de taxa.
*Matéria atualizada às 10h20 para acréscimo de informações