O Comitê Científico composto por especialistas e técnicos da Secretaria de Estado da Saúde Pública do Rio Grande do Norte (Sesap/RN) para enfrentamento à pandemia do novo coronavírus discute a necessidade de isolamento social total, o chamado lockdown, com o avanço de ocupação dos leitos. O assunto é pauta permanente do Comitê. Na última recomendação enviada à governadora Fátima Bezerra, na segunda-feira, 18, os especialistas afirmaram haver necessidade de “ampliação das medidas restritivas” se a taxa de transmissão do coronavírus aumentar e a ocupação dos leitos de UTI continuar alta, sem capacidade de ampliação de vagas por parte da Sesap/RN. Hoje, os leitos intensivos estão totalmente ocupados na região Oeste e metropolitana do Estado.
Ao contrário do Comitê Técnico do Consórcio Nordeste, que recomendou nesta quinta-feira, 21, o lockdown em Natal e Mossoró, o Comitê local adotou uma cautela maior em relação à medida. A principal razão para isso é a dificuldade de fiscalizar o cumprimento do decreto. Na recomendação da segunda-feira, os especialistas consideraram “urgente” uma articulação entre Estado e Municípios para “tornar os processos de enfrentamento mais eficientes, sobretudo no que diz respeito ao cumprimento do decreto estadual e as medidas fiscalizatórias no âmbito da vigilância sanitária e também de proteção aos idosos”.
Para o epidemiologista Ion de Andrade, integrante do Comitê local, as medidas de distanciamento em vigor no Rio Grande do Norte garantem 60% de distanciamento social se forem cumpridas integralmente. O índice de isolamento registrado pela empresa de tecnologia InLoco mostram, no entanto, uma adesão de 41,8% em todo Estado na quarta-feira, 20, última data com registros. Essa é a média da adesão desde a segunda quinzena de abril. “É preciso assegurar que o decreto seja cumprido”, disse Ion de Andrade nesta sexta-feira, 22.
Até o dia 15 deste mês, o Estado não possuía planos concretos para a implementação efetiva para um isolamento social total, conforme mostrou reportagem da TRIBUNA DO NORTE. O secretário-adjunto de Saúde do Estado, Petrônio Spinelli, declarou no mesmo dia que “o fundamental não é fazer o decreto, mas fazer na prática com que isso [o cumprimento] aconteça. Essa é uma questão que tem ser articulada internamente no governo e com a sociedade, para não virar uma peça sem utilidade.”
Isolamento Social
Na tentativa de melhorar o índice de cumprimento de isolamento social, o governo estadual passou a recomendar aos Municípios a implementação de barreiras sanitárias com o apoio da Polícia Militar e, no decreto publicado na quarta-feira, 20, o fechamento das orlas. O secretário estadual de Segurança Pública, Francisco Araújo, afirmou nesta sexta-feira, 22, que mais de 15 municípios já fizeram solicitações de apoio para realizar as barreiras sanitárias, mas nenhum pediu apoio para fechar a orla marítima.
“Os agentes do município fazem a fiscalização, junto com os agentes de segurança pública, e se alguém descumprir alguma medida do decreto vai ser orientado em um primeiro momento. Se insistir, vai ser levado à delegacia e o estabelecimento comercial será multado”, afirmou o secretário. “Mas ainda não se falou na proibição de acesso às orlas marítimas”, complementou.
Ainda segundo o secretário de Segurança, a fiscalização sobre as medidas de distanciamento social contam com apoio da força policial do Estado, mas também depende dos municípios – responsáveis, por exemplo, por decretarem o fechamento das orlas marítimas. “O cumprimento do decreto é uma norma que estabelece que, além dos agentes de segurança pública, as secretarias municipais de Saúde e os demais órgãos dos municípios tomem uma ação. Caso aconteçam os decretos de proibição das pessoas na praia, as forças de segurança pública do Estado irão apoiar.”
Diariamente, as autoridades estaduais de saúde apelam à população o cumprimento do isolamento social para aumentar a adesão e desacelerar o contágio do coronavírus. Para os especialistas, por exemplo, a taxa de transmissibilidade, ou seja, a média de novos infectados a partir de um infectado, pode chegar a 2 se o decreto for cumprido. Em Natal, os estudos indicaram uma taxa de 2,85 – ou seja, um infectado com coronavírus contagia outras duas ou três pessoas – no dia 8 de maio.
191 novas infecções são registradas em 24 horas
O Rio Grande do Norte registrou 191 novos casos confirmados e mais três mortes por coronavírus em 24 horas e chegou a 4.251 infectados nesta sexta-feira, 22. O Estado agora tem 181 mortes confirmadas e outras 47 em investigação. Os dados estão no boletim epidemiológico mais recente da Secretaria de Estado de Saúde Pública, divulgados na tarde desta sexta-feira, 22.
As estatísticas também mostram que o Estado tem 12.920 casos suspeitos da doença e outros 9.590 casos descartados. Além disso, 997 pacientes já se recuperaram de Covid-19 em todo Rio Grande do Norte.
A maioria dos casos confirmados estão concentrados na Grande Natal, e na região Oeste – Mossoró e Vale do Açu. “Nossa preocupação segue também em decorrência do nível de distanciamento social. Isso vem caindo nas últimas semanas, o que vem corroborando para o aumento de casos confirmados e também os óbitos”, afirmou Alessandra Lucchesi, subcoordenadora de Vigilância em Saúde da Sesap/RN.
Presente na coletiva de imprensa desta sexta-feira, Lucchesi chamou atenção para o número de óbitos em investigação, que permaneceu com números semelhantes durante toda semana. “Infelizmente todos os dias nós recebemos mais casos de óbitos que passam por esse processo de investigação. Apesar do número permanecer praticamente o mesmo todos os dias, são pessoas que perderam a vida e deixaram familiares, mas são casos diferentes ao longo deste processo”, informou.
Atualmente, 420 pessoas estão internadas com suspeita ou confirmação de covid-19. A maior parte (275) está na rede pública, dos quais 145 em leitos semi-intensivo ou UTI – o que indica o estado grave. Na rede particular, 145 estão internados, sendo 65 nem semi-intensivo ou UTI.
Preso infectado
O Sistema Prisional do Rio Grande do Norte confirmou o segundo caso de Covid-19 entre presos no Estado. Outros cinco apenados estão com suspeita da doença e 33 policiais penais estão infectados.
De acordo com a Secretaria de Estado da Administração Penitenciária (SEAP/RN), os presos com coronavírus apresentam sintomas como tosse, febre, falta de paladar e de olfato. Dos policiais penais, a SEAP/RN informou que cinco deles já se recuperaram e retornaram às atividades. Porém, outros 115 policiais penais estão afastados por suspeita de coronavírus e 55 servidores estão em sistema de teletrabalho por serem do grupo de risco.
Para suprir a demanda de policiais, a pasta informou que está promovendo alterações em escalas, regimes de teletrabalhos e revezamento de equipes com a finalidade de “reduzir o número de pessoas num mesmo local de trabalho”.
“Policiais que apresentam qualquer tipo de sintoma são imediatamente afastados e encaminhados à unidade de saúde, desta forma, evita-se o contágio coletivo de outros servidores e de pessoas privadas de liberdade. Como forma de suprir a necessidade de capital humano, diárias operacionais foram autorizadas e em acerto do Secretário com o Ministério Público, o limite de 20 diárias foi ampliado para 40, assim os profissionais voluntários podem compor as equipes que apresentam afastamento”, informou a pasta em nota.
Fecomércio/RN é contra lockdown em Mossoró
A Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (Fecomércio RN) e o Sindicato do Comércio Varejista de Mossoró, além de outras entidades de representação, ingressaram com pedido na justiça para serem assistentes simples na ação interposta pelo Sindicato do Trabalhadores em Saúde do Rio Grande do Norte (Sindsaúde/RN) contra o Estado do Rio Grande do Norte e o Município de Mossoró.
A exemplo do que aconteceu em Natal, ação do Sindsaúde/RN pede que o Estado e o Município sejam obrigados a decretar, de forma imediata, o lockdown como medida de distanciamento social. O pedido foi protocolado pela Fecomércio RN e pelo Sindivarejo Mossoró, em conjunto com a Fiern, Faern, Fetronor, Sebrae RN, Sinduscon Mossoró e Sindicato dos Hotéis, Bares, Restaurantes e Similares do RN.
A habilitação, sendo deferida, as entidades poderão atuar como assistentes do Governo do Rio Grande do Norte e Prefeitura de Mossoró para que não seja decretado o lockdown, podendo inclusive, recorrer, impugnar e contestar durante o processo.
Em decisão judicial proferida nesta sexta-feira, 22, o processo foi extinto sem resolução do mérito, sob o fundamento da ausência de legitimidade ativa do Sindicato dos Trabalhadores em Saúde do Estado do RN para promover a Ação Civil Pública.