“Não importa qual seja o problema, algo pode ser feito a respeito”, promete um folheto amarelo que vem sendo distribuído no centro de cidades como São Paulo e Rio, além de Manaus e regiões ribeirinhas do Amazonas.
A filipeta promete ajuda para problemas com drogas, violência urbana ou pendengas familiares, e não revela quem assina o texto. Mas foi impressa pela Cientologia, grupo religioso com fiéis famosos como Tom Cruise e John Travolta.
O BuzzFeed News apurou que a religião americana está numa investida no Brasil. Missionários estrangeiros foram trazidos ao país para uma turnê de recrutamento que inclui as duas maiores cidades brasileiras, além de regiões amazônicas.
Tenda no centro
Desde 9 de julho, a Cientologia montou uma tenda amarela na Praça da República, centro de São Paulo.
Lá, é possível fazer cursos de cinco minutos de duração, com temas práticos, como Resolver Conflitos, ou Integridade e Honestidade. Cada um deles é explicado em vídeos dublados que duram cerca de cinco minutos, e podem ser vistos numa TV instalada na própria tenda.
Há também uma maca, usada para uma aula prática. No módulo Ajuda Para Doenças e Lesões, o aluno se deita enquanto um missionário voluntário faz exercícios de toques que, defende a religião, vão fazer uma pessoa se curar mais rápido de doenças ou de traumas, porque seu cérebro estará mais atento às questões corpóreas.
Na manhã da segunda, dia 9, só há um interessado na religião. Um jovem está sentado em uma das mesas plásticas brancas, lendo um dos panfletos. “Está vendo ele? Ele tem problemas com drogas, e veio sozinho”, diz a missionária venezuelana, que mora nos EUA há anos.
Os três missionários que atendem o público são estrangeiros. Fazem parte de um grupo de seis pessoas de diferentes nacionalidades que moram nos EUA, já estão há anos na Cientologia e foram enviadas ao Brasil para arregimentar fiéis.
Religião de Hollywood
A Cientologia tem uma ligação umbilical com Hollywood. Foi fundada em 1954 por Ron Hubbard, que, antes de ser um líder religioso, escrevia livros de ficção científica e de auto-ajuda.
A religião prega que seus fiéis precisam se purificar para expurgar energias ruins. A influência negativa, dizem os textos sagrados, vem de longe.
Xenu, o ditador da Confederação Galáctica, trouxe bilhões de pessoas do seu canto do universo para a Terra, 75 milhões de anos atrás. No nosso planeta, o ditador jogou esse povo dentro de vulcões e os matou com bombas de hidrogênio. E esses espíritos imortais (chamados de thetans) podem causar mal para humanos até hoje.
A religião está no Brasil desde 1991 e conta com três centros na Grande São Paulo. Mas não teve grande sucesso na arregimentação de massas — a Cientologia nunca apareceu no Censo do IBGE ou em quatro pesquisas feitas pelo Datafolha sobre a fé do brasileiro.
Tampouco conquistou famosos nacionais. Não há notícia de uma celebridade brasileira convertida, ao contrário do que ocorre nos EUA. A sede é em Los Angeles, a quilômetros de Hollywood, e seus maiores garotos-propaganda são famosos como Juliette Lewis e Kirstie Alley, além de Tom Cruise, que há mais de duas décadas é fiel.
Em Hollywood, Nova York, Paris e Londres existem Centros de Celebridades, locais onde pessoas famosas podem estudar a religião com mais privacidade.
Mas, como se pode perceber pelos endereços populares pelos quais a caravana vai passar no Brasil, não são só estrelas que interessam à Cientologia. O grupo se expande em outras regiões do mundo, como a Europa e a Ásia, e está presente em mais de 140 países.
Na cultura pop
Há centenas de disputas judiciais envolvendo a Cientologia e ex-crentes. Um deles é da atriz Leah Remini, que foi fiel durante sua infância e parte da sua vida adulta. Remini, que participou de séries como “The King Of Queens”, hoje protagoniza uma série documental em que investiga a religião.
A fé cientológica também é registrada no documentário “Going Clear” (disponível na Netflix), dirigido por Alex Gibney, que narra a dificuldade de abandonar a religião.
Procurada pelo BuzzFeed News para conversar sobre seus planos de expansão, a Cientologia não respondeu aos pedidos de entrevista.
Chico Felitti